Um dos trabalhos que faço é alugar acomodações independentes do condomínio onde vivo, que pertence à minha mãe, através de um site de hospedagens. São poucos quartos, o que me permite atender os hóspedes de forma diferenciada, trocar mensagens e conversar com eles durante o tempo que se encontram aqui. É uma forma de ajudar a cobrir os gastos altíssimos da manutenção da propriedade, além de proporcionar um acolhimento especial para aqueles que descobrem o lugar pela primeira vez ou que estão voltando porque gostaram daqui. Lembro-me que, quando cheguei em Arraial d’Ajuda, mais de vinte anos atrás, fui muito bem recebida por aqueles que me hospedaram. Ter me sentido acolhida fez toda a diferença. Os donos da pousada viraram meus amigos e, ainda que eu não conhecesse ninguém nessas bandas, me apaixonei pelo que, na época, era só um vilarejo. Passei a voltar frequentemente até decidir me mudar de vez. Hoje tento fazer por outros o que fizeram por mim.
Infelizmente, como acontece em todos os lugares turísticos, o perfil de visitantes mudou ao longo dos anos. Antigamente, as pessoas vinham porque queriam algo diferente do que a vida à qual estavam acostumadas nas cidades. Quando se mudavam para cá e construíam suas casas, tentavam desmatar o mínimo possível. Hoje em dia, provavelmente também por causa da pandemia, a região está vivendo um forte boom imobiliário. No auge do verão, Porto Seguro virou um inferno quente e desmatado e Arraial d’Ajuda está se encaminhando para o mesmo destino. Enquanto isso, grandes empreendimentos continuam chegando, visando principalmente custos mais baixos e lucros mais altos. Constroem condomínios nos quais a vegetação é completamente suprimida mediante o pagamento de taxas irrisórias diante daquilo que lucrarão ao vender as casas. É de quebrar o coração, ainda mais porque sabemos que muitos desses empresários não vivem aqui nem conhecem o lugar, apenas lucram graças a ele, e não se importam em absoluto com as árvores centenárias e a mata nativa e insubstituível que estão destruindo, contribuindo para elevar tristemente a cidade à campeã de desmatamento da Mata Atlântica de todo o país. Sem falar em muitos outros danos ambientais que não mencionei.
Esses dias, recebi um hóspede de São Paulo que compartilhou comigo uma reflexão muito interessante. Ele me disse que sentia uma grande paz aqui e adorou o fato de termos um jardim muito exuberante e preservado, que faz com que as acomodações tenham privacidade e acesso a uma vista privilegiada da natureza ao redor. Por outro lado, ele confessou que, ao ver o terreno pela primeira vez, imediatamente pensou no quanto seria possível lucrar se o jardim fosse eliminado e toda a área fosse construída. Por fim, olhou para mim e disse: “Sei que este raciocínio é errado, que não está certo pensar só em dinheiro, deve ser meu condicionamento, de pessoa que vive numa cidade grande, que me faz pensar assim.” Achei fantástica a clareza dele ao reconhecer em si mesmo o padrão que está se repetindo em todos os lugares. O dinheiro e o lucro se tornaram mais importantes que o bem estar, que a qualidade de vida e a natureza, essencial à sobrevivência da espécie. Fomos condicionados a trivializar o anormal. Em todos os âmbitos, convivemos com o horror que nos fere como se fizesse parte irremediável de nós e não pudéssemos fazer nada contra isso. Mas podemos. E está na hora de começarmos. Assim, por exemplo, fundamos a associação sócio-ambiental Verdejar d’Ajuda. Sabemos que é um trabalho de formiguinha, mas é muito melhor do que não fazer nada. E você, o que tem feito para mudar o inaceitável?